Wednesday, August 16, 2006

Sobre a fotografia e a primeira pessoa

Não me parece possível falar de fotografia que não em primeira pessoa. (e não há nada de controverso nisto). Porque só pode falar de fotografia quem já escreveu o tempo, quem já morreu de amor, quem já tomou o morto pelo vivo. Só pode escrever de fotografia quem já sofreu porque descobriu não ter mais que uma imagem viva de uma coisa morta, quem já trocou a experiência pela imagem, quem já se tornou imagem. Só pode escrever de fotografia quem já fez turismo em cartão postal e acordou sem saber chegar a Torre Eiffel. Só pode escrever de fotografia quem já, na imagem, se tornou outro.
E, então, quem escreve, não é mais o eu. Quer dizer, o eu que fala não tem número de identidade, endereço residencial, telefone comercial. Não prefere peixe à frango nem a noite ao dia. Não tem gato nem cachorro, tampouco inventa ou exibe uma vida amorosa. Sou eu enquanto sujeito impessoal.

(e o fato de que a fotografia seja cada vez mais associada a um narcisismo messiânico que beira ao patético não tem nada que ver com isso)

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